Um eremita, uma cabana, uma palmeira

Outro ancião que havia sido nomeado Bispo de Oxirinco, contou o seguinte… (falando como se tivesse ouvido de outra pessoa, mas depois se averiguou que era ele) : “ Um dia, pensei que devia entrar no deserto bem em seu interior, fazia parte de um oásis, em um território de los Macisos, pois talvez ali encontraria algum servo de Deus.

Com alguns pãezinhos e um recipiente de água para quatro dias, me pus a caminho. Transcorridos os quatro dias se esgotaram minhas provisões. O que fazer? Fiz um ato e confiança em Deus e decidi continuar. Aguentei outros quatro dias sem comer nada. Porém meu corpo já não podia suportar o jejum e o cansaço do caminho. Veio o desalento e me deixei cair no chão. Alguém veio, tocou com seus dedos meus lábios, como um médico molha os olhos com saliva, e ao ponto recobrei minhas forças e me parecia como si não houvesse caminhado nem padecido minhas forças, e me parecia como si não houvesse caminhado nem sofrido sede. Ao sentir essa força em mim, me levantei e continuei andando pelo deserto.

Passaram outros quatro dias e a fadiga me fez desfalecer de novo. Elevei minhas mãos aos céus e o homem que me havia confortado a primeira vez, passou de novo seus dedos por meus lábios e me devolveu as forças.

Ao cabo de dezesete dias descobri uma cabana, uma palmeira e um eremita de pé perto dela.

Seus cabelos, totalmente brancos, lhe serviam de vestido. Seu aspecto era espantoso e começou a orar assim que me viu. Depois que disse amém, se deu conta de que eu era um homem, me tomou pela mão e me perguntou :- Como chegaste até aqui ? Existe ainda o mundo todavia? Ainda existem as perseguições ?

Eu lhe respondi: – É por ti verdadeiro servo de Nosso Senhor Jesus Cristo, que eu percorro o deserto. Graças ao poder de Cristo, hão cessado as perseguições, porém eu te rogo que me digas, como há chegado até aqui?

Ele me respondeu chorando: – Eu era Bispo e no curso de uma perseguição fui submetido a tortura durante muito tempo. Por fim não resisti e fugi abandonando a diocese… Porém eu  caí em mim, confessei meu pecado e me penitenciei a morrer neste deserto. Faz quarenta e nove anos que Vivo aqui, louvando a Deus, e pedindo- Lhe que me perdoe meu pecado.

O Senhor Deus, me alimenta com esta palmeira, e tive que esperar quarenta e oito anos para ter a certeza íntima do meu perdão. Este mesmo ano me foi concedida essa graça.

Depois de dizer-me tudo isso, no meio de um mar de lágrimas, se levantou logo, e saiu depressa e esteve longo tempo em oração. Ao terminar, voltou ao meu lado. Olhei seu rosto e tremi, pois parecia um fogo. Mas ele me disse:-Não temas nada, Deus te enviou para amortalhar meu corpo e dar-lhe sepultura.

Apenas terminou essas palavras estendeu suas mãos e seus pés e expirou. Descosturei minha túnica e guardei uma metade para mim. Com a outra metade envolvi o venerável corpo e o amortalhei. Terminado o enterro, a palmeira secou e a cabana desmoronou. Chorei durante muito tempo, pedindo a Deus que me devolvesse de uma ou outra maneira aquela palmeira para que pudesse parar naquele lugar o resto de minha vida, porém, não fui atendido… Disse então a mim mesmo : -Não é a vontade de Deus.

Fiz oração e me pus a caminho de volta para o mundo. O homem que havia tocado os meus lábios apareceu de novo e me devolveu as forças. Graças a Ele pude chegar de novo até o lugar onde residiam meus irmãos, aos que hei contado esta história para convidá -los a meditar de que não desesperarmos nunca de nós mesmos, senão encontrar a Deus pela penitência.’’

(Sentenças dos Padres do Deserto, Cap. XX, 12)